Minha empresa tem perfil para ser franqueadora?

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Minha empresa tem perfil para ser franqueadora?

10/05/2013

Por Melitha Novoa Prado

Estava na metade deste artigo, iniciando a parte em que iria organizar os assuntos da melhor maneira possível, quando a secretária repassou-me uma ligação de um sujeito a quem, por questões éticas, darei um nome fictício: João.

– ‘Dra.? Meu nome é João e tenho dúvidas a respeito de alguns assuntos relacionados à franquia… poderia me ajudar?

– ‘Acredito que sim. Quais são as suas dúvidas?’

– ‘Tenho uma escola de informática aqui no Nordeste há mais de 10 anos e gostaria de franquear o método que eu mesmo desenvolvi.’

Fiz algumas perguntas e dei outras tantas respostas, no limite do que me permite o Código de Ética do Advogado. Algumas de suas perguntas eram um tanto ingênuas – sendo bastante gentil -, e outras espantosamente desnecessárias, como ‘quanto se costuma cobrar de royalties’, ‘quem vende franquias’ etc… enfim, chegamos ao final da ligação:

– ‘Podemos sim, marcar uma reunião aqui no escritório, em São Paulo… terça-feira à tarde, tudo bem?’

– ‘Terça-feira próxima? É… não vai dar não. A senhora poderia me atender de sábado? Sabe o que é, eu mesmo dou aula todos os dias, de segunda a sexta-feira, das 8 da manhã às 10 horas da noite. Isso aqui sem mim, não anda.’

Ele, e mais alguns tantos outros empresários têm todo direito de achar que sua idéia é franqueável, porém, há outros requisitos que devem ser preenchidos e outras variáveis que devem ser consideradas antes de entrar num mercado tão híbrido quanto o do segmento de franquia.

Faltava a este empresário praticamente todos os requisitos desejáveis para se tornar um franqueador de sucesso, excetuando-se, talvez, o seu método de ensino exclusivo (sem registro, aliás):

Idéia franqueável e reproduzível nas mais diversas condições oferecidas pelo mercado

A essência de um sistema de franquia é o que se oferece ao consumidor final. Se um serviço ou se um produto, a existência de um diferencial, seja este determinado pela competência ou pela exclusividade, é essencial. Sem isso, não há franquia, exceto quando se trata dos canais de micro-distribuição uma vez que eles não têm contato com o consumidor final do produto ou do serviço. Portanto, são exceções dentro do sistema de franquia, no quesito ‘diferencial de produto ou de serviço ao consumidor final’.

A reprodução do negócio deve se tornar possível nas mãos de terceiros, consideradas as variáveis do mercado. A reprodução deve estabelecer, todavia, algumas constantes, tal como o público-alvo, o número de habitantes desejável, a logística do ponto comercial, entre outros.

Experiência própria com atestado de sucesso

As operações próprias de sucesso são, ao meu ver, imprescindíveis e determinantes. Alguns grandes franqueadores entram no mercado de franquia, sem operações próprias logo de início. Isso acontece mais com as ditas franquias de indústria, aquelas sob as quais sedimenta-se um canal de escoamento de produtos da própria indústria, através das franquias. Alguns desses sistemas – ausentes de operações próprias -,  cedo ou tarde, tendem a deparar-se com sérios problemas na ponta, já que não vivenciaram a rotina de um varejista. Quando surgem problemas nesta ponta, os quais necessitam da intervenção do franqueador, a resposta deve ser rápida, sob pena de serem concretizadas as conseqüências advindas da não-solução do dito problema, ou sob pena de descentralização do sistema de franquia, pela falta de expertise e competência do próprio franqueador. Cada franqueado passa a fazer aquilo que entende melhor para si.

Organograma funcional

Aqui, não falamos de um organograma de grandes empresas, contudo, é necessário que o franqueador disponha de pessoal para atender aos seus franqueados. A comercialização de franquias, o treinamento, a operação em si, tudo isso faz parte da rotina de um sistema de franquias. Isso determina que tipo de franqueador se deseja ser. O início pode ser ‘enxuto’, mas com o crescimento da rede, ter um quadro de funcionários razoável parece ser inevitável. Isso certamente faltava ao João de quem falei em linhas anteriores.

Marca, registro de métodos e patentes

Se a franquia se baseia na marca ou num método registrável, ou numa patente de invenção, há de se ter o registro. Muito embora não haja norma que determine o registro de tais para que mereçam proteção, penso que seja necessário obtê-los para assegurar que seus parceiros comerciais não sofram qualquer tipo de prejuízo em decorrência de um eventual esbulho ou indeferimento de propriedade da marca, do método ou das patentes.

Formatação

A formatação do Sistema de Franquia, como negócio do Franqueador, é condição sine qua non. O mercado atual não aceita aqueles que tenham a intenção de testar ou de trabalhar com a sorte. Se um dia isto funcionou – como acredito que tenha funcionado há muitos anos – não funciona mais. Até o pioneirismo não é mais tão pioneiro assim. Portanto, formatar o negócio, a reprodução do sucesso nas franquias, requer a contratação de profissionais no ramo. É preciso estudar os impactos de impostos, o quadro de funcionários desejável, a logística do escoamento, as taxas do sistema, a manualização e tudo o mais, que só um profissional capacitado pode fazer com competência.

A formatação inclui a elaboração dos documentos jurídicos que externará a relação dos parceiros com o franqueador. A Lei 8.955/94 é clara em dizer da necessidade de se oferecer uma Circular de Oferta de Franquia, com informações básicas sobre o sistema, incluindo a mostra de um modelo de contrato (e pré-contrato, se o caso). Tal documento, além de ser uma imposição legal, determina – ou tende a determinar – as obrigações de cada uma das partes, estabelecendo os limites necessários para a manutenção da saúde da rede e do sistema de franquia.

Subjetividades

Essa é a parte mais difícil. Conheço muitos franqueadores, de perfis os mais diversos. Alguns extremamente centralizadores, outros nada centralizadores. Uns que trabalham efetivamente na ‘operação de balcão’, outros na ‘administração de mesa’. Não há um perfil ideal da pessoa física do franqueador. Há, dentro de um perfil, algumas características que levam o sistema a ter uma determinada experiência. Aqueles sistemas em que a pessoa física do franqueador é presente na própria operação da rede tendem a ser mais enxutos, ainda que o número de franquias seja grande. Já aqueles franqueadores que administram a rede sem participar de sua rotina tendem a ter um quadro organizacional muito maior. Nem uma nem outra pode se dizer melhor ou pior. Nem do ponto de vista financeiro isto é muito claro, porque se de um lado é econômico, de outro pode ser estanque; se de um lado, é dinâmico, do outro pode ser custoso.

Nada obstante, duas noções que posso afastar de plano como indesejáveis para o perfil do franqueador: não se enriquece apenas vendendo franquias; não se tem no sistema de franquia uma reprodução do negócio através de filiais. Quem pensa assim, está fadado ao insucesso. O primeiro, porque não fideliza a sua rede e o fechamento das unidades passa a ser rotina; o segundo, terá problemas de relacionamento e atravancará a sua expansão.

Portanto, ‘Senhores’ João, muita atenção antes de tornarem-se franqueadores. Há muito trabalho à frente, aliás, por todos os lados.

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