Rede de fast-food McDonald's cresce fazendo o básico
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Rede de fast-food McDonald's

McDonald’s cresce com volta ao básico

23/11/2017

Financial Times (Valor Econômico) – Anna Nicolaou – 21/11/17

 

É a “zona morta” entre o almoço e o jantar e mesmo assim o McDonald’s está agitado com clientes fazendo seus pedidos com tapinhas em telas enormes. A loja de Chicago serve como modelo para a reorganização da maior rede de lanchonetes fast-food do mundo em seu maior mercado. Uma estrutura de vidro exibe tortas de maçã e croissants recém-saídos do forno. Funcionários sorridentes, vestidos todos de preto, carregam bandejas de hambúrgueres e batatas fritas para mesas minimalistas. “O cheiro nem parece o de um McDonald’s”, diz uma pessoa presente.

Quando perguntado por que está investindo US$ 2 bilhões para remodelar milhares de lojas nos Estados Unidos para que fiquem iguais a esta, Steve Easterbrook, o CEO do McDonald’s, é interrompido por um cliente que pede seu nome de usuário no Instagram. “Você tem IG, certo?”, grita ele, sacudindo seu iPhone. Trata-se de um aspirante a fotógrafo em busca de seguidores nas redes sociais e sua pergunta responde a minha – esse é o consumidor que a rede de lanchonetes de 62 anos busca.

Easterbrook, um contador britânico de fala mansa, trabalha na rede de fast-food há mais de duas décadas. Ele assumiu o comando em 2015, encarregado de reconquistar parte do meio bilhão de clientes perdidos nos EUA desde 2012. Adotou como missão reinventar o McDonald’s como uma “companhia de hambúrgueres moderna e progressiva”.

Ele usou essa frase quando assumiu o cargo, um mês após o grupo divulgar a primeira queda anual das vendas pelo critério “mesmas lojas” (que compara pontos em funcionamento há ao menos um ano) nos EUA em 12 anos. Na ocasião, observadores declararam que a empresa, que ajudou a definir a dieta dos americanos, havia perdido a identidade. Easterbrook repetiu as palavras nas teleconferências posteriores de resultados.

“Isso foi meio que o norte deles”, diz Sara Senatore, analista da Bernstein. Um ex-funcionário é mais direto, descrevendo a frase como um “clichê” que pode significar “tudo ou nada”.

Mas por mais vago que soe o plano, parece estar funcionando. O momento é difícil para os restaurantes dos EUA. O setor registra “pouco ou nenhum” crescimento nas visitas nos últimos dois anos, segundo a empresa de pesquisas de mercado NPD Group. A publicação setorial “QSR” declarou que 2016 foi o pior ano para os restaurantes desde a crise financeira. A deflação dos preços dos alimentos estimulou o preparo das refeições em casa. Além disso, há um excesso de restaurantes que permite às pessoas escolher mais quando decidem sair para comer.

Mas após quatro anos de retração no movimento, no terceiro trimestre o McDonald’s conseguiu atrair de volta os clientes, registrando um aumento das visitas. As vendas comparáveis subiram entre 4% e 7% em cada trimestre deste ano. Os investidores vêm elogiando os progressos: o preço da ação da rede subiu 70%, para US$ 168, desde que Easterbrook assumiu o comando. A remodelação já alcança grande parte da Europa, com cerca de um terço dos restaurantes franceses e alemães reformados.

O McDonald’s alimenta quase 70 milhões de pessoas por dia, fazendo da história de como conseguiu se recuperar de uma perda “estonteante” de clientes um caso de estudos no ramo da alimentação. Executivos da rede insistem que o sucesso se baseia no retorno aos baixos preços e na conveniência, e não na tentativa de satisfazer caprichos dos clientes. Com vendas anuais de US$ 25 bilhões e uma das marcas mais reconhecidas do mundo, as chances estavam a seu favor nessa retomada. Mas a maneira como o McDonald’s conseguiu isso foi uma surpresa até mesmo para seus próprios diretores.

Em 2014, a interpretação geral era de que o McDonald’s estava sendo destronado por novos rivais como o Chipote Mexican Grill, num setor chamado de “fast casual”. Essas redes surgiram após a crise financeira, com preços alguns dólares mais altos que os das tradicionais cadeias de fast-food, mas com uma percepção de que a comida podia ser mais saudável.

O crescimento das vendas globais em “mesmas lojas” do McDonald’s ficou em torno de zero nos últimos anos, com a demanda fraca nos EUA, na Ásia e na Europa, antes de cair mais de 3% no fim de 2014. Isso levou Don Thompson, o CEO na época, a prometer uma “ação decisiva para uma mudança fundamental” dos negócios.

Ele prometeu cortar os custos em US$ 300 milhões e abrir um número menor de lojas, antes de ser substituído por Easterbrook quatro meses depois. A participação de mercado nos EUA caiu de 17,4% em 2012 para 15,4% em 2016, segundo a Euromonitor.

No ano passado, Easterbrook contratou Lucy Brady, uma executiva de longa data do Boston Consulting Group, para investigar o que estava dando errado. Ela comandou um amplo estudo para dissecar onde as pessoas estavam comendo. Seus resultados, que Easterbrook descreve como “frustrantes, mas na verdade reconfortantes”, mostraram que a maioria dos clientes perdidos do McDonald’s estava indo para outras redes de fast-food como Wendy’s e Burger King, em vez das “fast casuals” concorrentes.

Os clientes não haviam se cansado do fast-food, eles só não queriam o fast-food do McDonald’s. A resposta de Easterbrook foi adaptar a doutrina “progressiva moderna” e adotar um foco menos ambicioso: “o básico do dia-a-dia”. Isso se materializou no corte dos preços do café e dos refrigerantes, na oferta de desjejum o dia todo, em serviços de entrega e na melhoria da qualidade, ainda que não no valor nutricional, de sua comida.

“Para o mérito de Steve, ele não é teimoso”, diz Larry Light, ex-diretor de marketing do McDonald’s. “Em vez de tentar criar novos tipos de saladas de repolho com feijão, ele preferiu reparar o que já era familiar. O fast-food não está em declínio e acho que sempre será a maneira preferida do mundo se alimentar.”

Andar pela sede do McDonald’s é como voltar no tempo. Quatro níveis de balcões desbotados de tijolos envolvem um átrio da década de 70, fazendo com que ela se pareça mais com uma biblioteca pública do que com a sede de uma companhia de hambúrgueres avaliada em US$ 136 bilhões. O grupo está prestes a mudar seus escritórios para o centro de Chicago, onde terá como vizinhos empresas como o Google, após seis décadas esparramado por 150 acres de florestas nos subúrbios de Illinois.

Desde sua estreia em 1955, o McDonald’s apresenta-se como um lugar onde a comida é barata. Ele inseriu o fast-food na dieta dos americanos, à medida que o sistema agroindustrial se desenvolveu para tornar possível a venda de hambúrgueres a US$ 1.

Executivos e ex-funcionários do McDonald’s, além de analistas, concordam que o preço é um dos motivos de a rede ter perdido clientes. “O McDonald’s perdeu a noção de valor”, afirma Sara Senatore. “Depois que a companhia parou de vender seu Dollar Menu em 2013, ela nunca surgiu com algo que fosse tão interessante”. O Dollar Menu respondia por cerca de 14% das vendas totais nos EUA.

Após segurar os preços por anos, o aumento das commodities e dos salários pressionaram as franquias independentes que operam a maior parte de seus 37 mil restaurantes no mundo. Elas começaram a reajustar preços, o que “destruiu a mensagem sobre custo-benefício”, diz Richard Adams, ex-diretor de franquias do oeste dos EUA, que vendeu seus restaurantes e agora presta consultoria. “Eles não podiam anunciar o Dollar Menu [nacionalmente] porque os franqueados tinham aumentado seus preços acima daquilo.”

Wendy’s e Burger King lançaram ofertas com quatro itens por US$ 4, o que as ajudou a preservar uma participação de 11% do mercado de fast-food americano, enquanto o crescimento de redes menores como Sonic Burger e Jack in the Box reduziu a dominância do McDonald’s no setor.

Há quem questione a sensatez da decisão da rede de começar a adaptar seu menu por região em 2004. Light, que comandou o esforço, diz que foi algo “controvertido” internamente para uma companhia que havia sistematizado seu cardápio a ponto de decidir quantos pedaços de picles eram colocados nos sanduíches.

Em 2014, enfrentando os “fast casuals”, o McDonald’s deu mais um passo na estratégia, com mensagens contraditórias e às vezes estranhas sobre seu cardápio. O grupo colocou clementinas [um tipo de tangerina] nos Happy Meals e abacate em sanduíches de frango, enquanto tentava ao mesmo tempo apelar para a nostalgia dos hambúrgueres, veiculando anúncios que zombavam das novas tendências de consumo. “Jamais haverá couve aqui”, declarava um anúncio do Big Mac em 2015.

Sob a supervisão de Easterbrook, a companhia adotou uma “postura halteres” em relação ao seu menu, reforçando suas ofertas nas pontas mais baixa e mais alta dos preços. Os descontos são uma parte central do plano e o McDonald’s está oferecendo cafés e refrigerantes a US$ 1 e US$ 2.

Num aceno aos consumidores mais preocupados com a saúde, a rede também prometeu eliminar os antibióticos da carne de frango e o melado de milho dos pães, substituiu manteiga por margarina e trabalha para usar carne fresca no lanche Quarteirão.

Mas será que a comida pode ser barata e ter uma melhor qualidade? “Tudo diz respeito a equilíbrio”, diz Easterbrook. “Você não pode simplesmente ir com tudo para a ponta premium, porque aí você prejudica os clientes mais preocupados com os preços”. Um novo “value menu” será anunciado no ano que vem, com preços acessíveis de US$ 1, US$ 2 e US$ 3.

As ofertas mais caras não são necessariamente saudáveis. O sanduíche de maple-bacon e mostarda picante, com frango empanado, contém 740 calorias e 1.780 mg de sódio, quase 80% das doses diárias recomendadas. “O paladar dos americanos ficou mais sofisticado”, diz Sara Senatore. “Não se trata necessariamente de menos calorias, e sim de usar alimentos integrais, e o McDonald’s está fazendo isso. Mas, basicamente, a comida ainda é bastante indulgente.”

Easterbrook passou grande parte de sua permanência no Reino Unido defendendo a imagem dos arcos dourados, a ponto de solicitar ao Oxford English Dictionary (OED) que mudasse a definição da frase McJob (que quer dizer trabalho mal pago e desestimulante). O OED se recusou. Mas suas táticas valeram a pena e ele é tido como o responsável pela revitalização das vendas no Reino Unido em 2006.

Há décadas a companhia é criticada por seu papel implícito na crise global de obesidade. Governos estão intensificando campanhas de alimentação saudável que, segundo analistas, podem ameaçar a recuperação do McDonald’s. Para eles, a companhia não está livre das dificuldades. “As perdas de participação de mercado podem ter chegado ao fim”, afirmam analistas da RBC. “Mas no passado, as manchetes sobre a epidemia de obesidade foram propaganda negativa para o McDonald’s.”

Novas regulamentações, como a contagem obrigatória de calorias, poderão “impactar negativamente as margens”, acrescentam eles. Mesmo assim, os analistas que cobrem o McDonald’s continuam otimistas: mais de dois terços deles classificam a ação da companhia como “strong buy”, mesmo com o preço do papel tendo se valorizado mais de 40% no último ano.

A tendência dos produtos orgânicos e personalizados vem sacudindo grandes grupos de produtos de consumo como a PepsiCo e a Procter & Gamble. Embora recebendo questionamentos que vão de “vocês vendem comida de verdade?” a “vocês fazem seus hambúrgueres com carne de minhoca?”, o McDonald’s agora assegura aos seus clientes que usa ovos frescos nos Egg McMuffins e paleta de porco moída em seus McRibb.

“Uma das mudanças mais significativas para todas as empresas desde a crise financeira é que os consumidores estão mais exigentes e querem saber mais sobre você”, diz Easterbrook. “Eles estão questionando mais todo tipo de autoridade… Você não está mais no controle da sua mensagem.”

Sara, da Bernstein, diz que “é difícil afirmar que eles não melhoraram a percepção entre pelo menos alguns consumidores. Há dois anos a questão era se Easterbrook poderia fazer nos EUA o que fez no Reino Unido, por se tratar de um mercado muito maior. Ocorre que ele conseguiu”.

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